Essa é a segunda parte da lista. A primeira parte você pode ver aqui.
Meninas Malvadas (Mean Girls) - 2004
“Meninas Malvadas” é um marco inegável da cultura pop, sendo impossível de escapar de referências, estáticos, gifs, quotes, peça na Broadway, remake musical e 37 lojinhas online que vendem uma camiseta escrita “a little bit dramatic” 20 (V I N T E) anos após seu lançamento. Mas esse sucesso estrondoso é limitado a um nicho específico.
Baseado no livro “Queen Bees and Wannabes”, o filme mostra de forma mais ou menos sutil como mulheres são socializadas para serem sempre perfeitas, perseguirem sempre o maior prêmio possível (um homem), eliminar a concorrência a qualquer custo e a hostilizar quem não se adequa a esse padrão. Na minha opinião não é o tipo de reflexão que deve ser feita apenas por suas vítimas diretas, mas também por quem ajuda - e se beneficia - com a existência desse processo.
Talvez se ele tivesse sido lançado em 2023, com a Greta Gerwig na direção, Margot Robbie como Cady, Ryan Gosling como Aaron Samuels, America Ferrera como Jan… ah não, pera, esse filme é OUTRA comédia sobre como mulheres são socializadas para serem sempre perfeitas, a diferença é que esse saiu do nicho e o Oscar notou, então é levado mais a sério.
As Apimentadas (Bring it on) - 2000
Esse filme nunca teve uma chance real no Brasil, “As Apimentadas” está no meu top 5 de piores traduções de título, mas como já trabalhei com isso sei que tem uma grande possibilidade da pessoa que escolheu essa tradução ter tomado a decisão sem nem ter assistido ao filme.
“Bring it On” foi sucesso de bilheteria e crítica, e rendeu outras 6 continuações (bem abaixo do original, infelizmente), mas é constantemente esquecido no churrasco quando o assunto é filmes de “mulherzinha” apesar de ter Kirsten Dunst, Gabrielle Union e Eliza Dushku como protagonistas.
Deve ser porque o plot discute apropriação cultural e privilégio branco, temas que até hoje encontram resistência em certas camadas da sociedade. Mas qual a novidade em um filme que dá destaque a questões importantes da sociedade não ser levado a sério porque aparentemente não dá pra fazer uma crítica social válida enquanto se faz uma comédia com mulheres jovens como protagonistas?
Com o recente aniversário de 25 anos do filme e uma exibição especial com a presença da Kirsten Dunst cantando a música icônica da cena de abertura, eu tenho fé de que os jovens do tiktok irão atrás dessa pérola e ela finalmente terá o lugar de destaque que sempre mereceu. Eu inclusive já vi uns dois edits da Big Red passando no meu feed.
Orgulho & Preconceito (Pride & Prejudice) 2005
A lista começou com uma adaptação de Jane Austen, e vai se encerrar com outra.“Orgulho & Preconceito” foi aclamado por público e crítica durante seu lançamento, ainda que arrastado na parede de chapisco por entusiastas ferrenhos da obra de Jane Austen.
O filme é reconhecido por ter um elenco incrível (sendo a estreia de muitos grandes nomes), a química inegável entre a Keira Knightley e o Matthew Macfadyen, um roteiro inteligente e cenas icônicas, mas pouco se fala da inovação que ele trouxe, e pra mim é aí que está a injustiça.
Além de todo esforço feito para não ser semelhante à série da BBC lançada em 1995 - tão amada que é usada como norte de comparação em toda adaptação do livro para cinema ou televisão - Joe Wright, em sua estreia como diretor de cinema, e seu time fizeram um grande esforço para modernizar e deixar a obra com um apelo maior para o público jovem.
Diversas licenças poéticas foram feitas em relação à obra original, mas pra mim foi o primeiro filme de época que pareceu REAL. Os registros que temos do passado sempre serão enviesados e embelezados por quem fez o registro, então temos a impressão que no passado todo mundo era mais educado e adequado do que provavelmente eram.
Mas nesse filme vemos pessoas se comportando diferente do padrão que aprendemos em aulas de História e obras da época. Elisabeth chegando com o vestido cheio de lama e o cabelo desgrenhado na casa dos Bingley, pessoas genuinamente se divertindo (e aprontando) em bailes, mães fazendo misturas para melhorar da ressaca no dia seguinte, um pedido de casamento em que os dois estão de pijama, todas são situações que não vemos muito em obras que retratam o século 18.
Outra coisa que me agrada muito é que todos os sets parecem “vividos”, principalmente a casa dos Bennet - com sua sala bagunçada e quintal cheio de bichos e lama. Isso se deve ao fato de que o filme foi inteiramente gravado em locações, ou seja, nenhum dos cenários foram construídos para a gravação. No máximo a sala de alguém foi adaptada para voltar a se parecer com uma sala do século 18.
É incrível que anos depois, tendo perdido a conta de quantos plays eu dei nesse filme, eu ainda consiga encontrar alguma coisa nova a cada assistida. Da última vez foi o fato de que Mary, a irmã gótica dos Bennet, tem uma leve crush no chatonildo do Mr Collins.
Esse filme merecia muito mais que as quatro indicações no Oscar, com nenhuma vitória, com certeza. Ansiosa para saber o que mais vou ver de novo na próxima vez que assistir.
Filmes “para mulheres” são sempre relegados a uma caixinha, deixando pouco espaço para alcançarem outros públicos e raramente recebendo aclamações “apesar de”. Enquanto isso, filmes “para homens” dominam salas de cinema, rankings, nominações e elogios dos críticos, enquanto alcançam públicos diversos - eu mesma tinha a tradição de ver todos os filmes da Marvel na estreia mesmo não sendo o público alvo da campanha de marketing.
Acho que no fundo todo mundo sabe o porquê dessa clara diminuição de valor cultural que filmes, séries ou qualquer outro produto de entretenimento com temas e elencos femininos sofrem. Mas a questão é: você participa e concorda com isso?
Ps: Essa semana eu assisti “Fúria Primitiva” na Amazon, um filme que eu estava esperando muito pra ver. Aqui tem a prévia da minha resenha que provavelmente fará parte de alguma edição da newsletter.
Ps 2: Sigo fazendo testes de produtos para compartilhar resenhas por aqui, aguarde próximas edições ou me siga no instagram porque eu estou dando spoilers por lá.
Conte-nos mais sobre sua experiência com quem traduz títulos de filmes aqui no Brasil? Tenho MTA curiosidade em saber como eles inventam tanta coisa nonsense! Adorei a curadoria!
Lista excelente, me lembrou que preciso revisitar Orgulho e Preconceito E rever Meninas Malvadas, coisa que não faço há anos.